Antes de ser um líder mundial, o Brasil precisa ser um líder regional

Ex-membro do Partido Comunista e assessor da campanha presidencial do direitista Vicente Fox Quesada , o cientista político e ex-chanceler mexicano Jorge Castañeda defende que a posição política não é mais tão relevante, como quando chegou a dividir o mundo no século passado, e sim as convicções e causas. Com livre trânsito entre “parceiros de esquerda e de direita” na luta pela defesa dos direitos humanos, hoje poderia ser classificado como um moderado, com uma visão global, voltado aos problemas comuns que afetam a liberdade, como a disputa entre a política e a religião e as ameaças à democracia. Sobre a política externa brasileira, sugere que o país dê mais atenção às questões regionais, não tanto às mundiais, o que lhe daria mais força. Castañeda falou com a Gazeta do Povo durante o 1.° Fórum Unimed de Política, que ocorreu na semana passada, em Foz do Iguaçu.Ao mesmo tempo em que se vê a defesa da democracia na América Latina, também se espalham os governos de caráter ditatorial. Quem tem mais condições de vencer essa batalha ideológica?Nós temos hoje na América Latina uma consolidação muito forte da democracia na maioria dos países. Uma democracia ainda com falhas, mas muito melhor do que no passado. Também existe uma tentação autoritária em alguns países, como é o caso das neoditaduras ou dos governos neoautoritários da Venezuela, da Bolívia, do Equador e da Nicarágua. Estas ainda são democracias no que diz respeito às liberdades de imprensa, sindical e de associação, porém caminhando para presidências perpétuas, com os poderes Judiciário e Legislativo bastante submissos ao poder Executivo, e inaceitáveis violações dos direitos humanos. Nós temos as duas situações, mas, pelo que se pode analisar, a consolidação da democracia ainda é mais forte que a tentação autoritária, que tende a se enfraquecer.O Brasil seria um modelo a ser seguido nesta defesa da democracia?O Brasil poderia ter um papel muito importante, mas não tem ocupado esse espaço e não quer ter essa responsabilidade. Poderia ser um defensor muito importante da democracia e dos direitos humanos, influenciando seus vizinhos latino-americanos. O presidente Lula não quis saber disso. Já a presidente Dilma é mais provável que seja sensível a este papel que o Brasil pode exercer nesse cenário político. Esta deveria ser a preocupação do país. Antes de ser um líder mundial, o Brasil precisa ser um líder regional e se atentar para essa capacidade que tem, até mesmo para se fortalecer. Ele tem muito respeito e admiração de países da região.Recentemente a presidente Dilma disse que o Brasil não abrirá mão de ser um protagonista na solução de tensões mundiais. Isso significa que ela dará continuidade à política externa defendida pelo ex-presidente Lula?Se ela disse isso, está bastante equivocada e vai continuar cometendo os mesmo erros do ex-presidente. Lula não compreendeu bem que o Brasil não está pronto para ser uma potência mundial. Para isso, ainda precisa amadurecer muitos conceitos dentro do próprio governo, das elites econômicas e da população. O Brasil tem se apresentado como uma potência mundial, mas ainda não é. Questões, por exemplo, como a do Irã e da Líbia, das quais fez questão de participar e mostrar apoio, não são suficientes para dizer que o país tem toda essa influência. Que influência os atuais conflitos no Oriente Médio e a morte de Osama bin Laden terão sobre o cenário político internacional?Nós estamos vendo o nascimento, com muita dor, de uma nova ordem jurídica internacional. Nós tivemos recentemente a intervenção humanitária na Líbia, as críticas e dúvidas sobre a execução de bin Laden pelos EUA e percebemos muitos avanços também no Conselho dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas. A Primavera Árabe – movimento pela democracia nos países islâmicos iniciado em 2005 e que voltou a ganhar força recentemente em alguns países do Oriente Médio e do norte da África –, tem uma grande responsabilidade neste novo cenário, principalmente por conta do apoio da Liga Árabe, dos europeus e dos EUA, derrubando a política de não intervenção. Esta é uma luta antiga. Qual a diferença agora?A diferença está na forma de intervenção. As forças populares nestes países, diferentemente de momentos anteriores, estão exigindo a intervenção contra as ditaduras. Internacionalizar a luta pela democracia, pelos direitos humanos e das mulheres é bom para todo o mundo. Até pouco tempo atrás esta luta não contava com a participação internacional como vemos agora a favor da população árabe, inclusive com apoio financeiro. Antes o que se via era a intervenção imposta pelos países ocidentais contra os árabes, independentemente da vontade e da participação popular. Esta onda solidária à vontade popular pode se estender a outros países?Hoje o ideal é que, apesar de ainda inimaginável, o mesmo pudesse acontecer com a China e com o Irã, países modernos, mas com governos ainda muito repressivos e retrógrados. Seria muito interessante se tivéssemos “primaveras” iranianas e chinesas.

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