Os desafios para Dilma Rousseff

Como esperado, Dilma Rousseff foi eleita presidente do Brasil no segundo turno eleitoral em 31 de outubro, a primeira mulher a governar o país.A liderança de Rousseff por 13 pontos percentuais no primeiro turno se mostrou insuperável pelo adversário José Serra, apesar dos tropeços da campanha de Rousseff e da falta de apoio da candidata do Partido Verde, Marina Silva.O trabalho de Rousseff foi predeterminado para ela. O presidente imensamente popular Luis Inácio Lula da Silva deixou desafios que se tornam mais difíceis a cada dia.A economia brasileira pode estar superaquecendo, estimulada pelos afluxos de capital, gerados em parte pela badalação da ascensão do Brasil e em parte pelas políticas recentes do Federal Reserve (Fed, o banco central) dos Estados Unidos, que visam baixar as taxas de juros americanas –o que leva os investidores a buscarem outros horizontes e maiores retornos em países como o Brasil.O afluxo de capital pode reacender a inflação no Brasil, manter as taxas de juros de longo prazo anormalmente altas e forçar uma desaceleração econômica. Não é de se estranhar que Lula tenha sido um dos principais críticos do Fed (e do presidente Obama) na cúpula do Grupo dos 20 em Seul, neste mês, e na mídia internacional.Há uma profunda fraqueza estrutural na economia, causada pelo fracasso do Brasil em investir em seu próprio crescimento. A taxa de investimento do país é de aproximadamente 18% do PIB. A taxa do México é de 22%; a da China é de 45%.Dadas as deficiências do Brasil em infraestrutura, educação e proteção ambiental, uma taxa de investimento insuficiente trabalha contra o alto crescimento. Sem a elevação dessa taxa, o Brasil não estará à altura das expectativas. O Brasil está desfrutando de um boom nas exportações de commodities, alimentado pela demanda colossal da China e da Índia –que poderá não durar.Rousseff deseja que o Estado exerça um maior papel no investimento, principalmente por meio do Banco Nacional de Desenvolvimento, ou BNDES, o que não é necessariamente a melhor solução. A tradição do Brasil de alto investimento do setor público nem sempre foi bem-sucedida –frequentemente empurrando para fora o setor privado e estimulando a burocracia e corrupção.Um desafio acaba causando outro. A política social de Lula se apoiou na Bolsa Família, onde famílias de baixa renda recebem um ajuda mensal caso suas crianças sejam vacinadas e frequentem a escola.Criado em 2003, o Bolsa Família reduziu dramaticamente a pobreza no Brasil –mas a um enorme custo para o governo. O programa foi projetado para quebrar o ciclo de pobreza de gerações, desenvolvendo capital humano para o futuro. Os filhos dos pobres, graças a uma melhor saúde, nutrição e educação, se sairiam melhor do que seus pais ao ingressarem no mercado de trabalho.Há treze anos, o México implantou um programa semelhante, agora conhecido como Progresa-Oportunidades. Ainda não há uma avaliação. O economista mexicano Santiago Levy, um fundador do programa, não está convencido de que os resultados serão conclusivos. Sejam quais forem os méritos do programa, o crescimento da economia informal do México também exerce um papel.O Brasil precisa de um crescimento comparável para sustentar o Bolsa Família.Rousseff também enfrenta desafios políticos, começando pela formação de seu governo. Por um lado, Rousseff deveria reduzir o número de ministérios criados por Lula; por outro, ela precisa pagar os favores, acomodar os aliados e rechaçar as pressões.Um ponto de pressão é o próprio Lula, que, independente do que diga, vai querer alguns assessores e aliados no novo gabinete. Outras reivindicações de cargos, ministérios e recursos virão do PMDB, que apoiou Rousseff na eleição; e de todas as facções dentro de seu próprio partido (e o de Lula), o Partido dos Trabalhadores (PT). Além disso, Rousseff precisa demonstrar sua independência, que não é uma Lula 2.O que leva ao seu próximo desafio: Rousseff carece da história de Lula com o PT e do poder dele sobre o PT. O partido, tradicionalmente à esquerda de Lula, acompanhou a contragosto o pragmatismo dele. A menos que Rousseff controle o PT com mão forte, ela reforçará a impressão de que poderia ser uma presidente interina, apenas aguardando pela reeleição de Lula em 2014. Interinos rapidamente se tornam “patos mancos” (expressão americana para políticos em fim de mandato, sem poder político significativo).O retrospecto de Lula na política externa é ambíguo. O Brasil se tornou um importante membro do G20 e está próximo de obter um maior poder de voto no Fundo Monetário Internacional. Mas Lula não conseguiu sua maior meta –uma cadeira permanente para o Brasil no Conselho de Segurança da ONU. Lula, trabalhando com a Turquia, não conseguiu intermediar o esperado acordo entre o Irã e o Ocidente. E ele não conseguiu muito progresso na solução das crises regionais na América Latina –apesar de ter gerado muita badalação com o fato do Brasil sediar a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016.A tendência de Lula foi agir mais como um líder do Terceiro Mundo do que como o de uma potência mundial. Mas ele adorava a ovação no palco mundial e desprezar Washington –às vezes com razão, às vezes não.Será que Rousseff será tão ativa quanto, ou tão arcaica? O melhor palpite: não para a primeira pergunta, sim para a segunda. Ela tem demonstrado pouco interesse nos holofotes internacionais, mas rivaliza Lula na defesa da soberania nacional e na defesa dos potências emergentes.Rousseff deve se envolver menos nos assuntos mundiais e mais em assuntos regionais, talvez se inclinando mais do que Lula na direção do presidente da Venezuela, Hugo Chávez, do presidente da Bolívia, Evo Morales, e de outros membros da esquerda radical regional.O Brasil, a região e o mundo estão observando como Rousseff lidará com esses desafios.Tradução: George El Khouri AndolfatoJorge Castañeda foi ministro das Relaçoes Exteriores do México durante a presidencia de Vicente Fox e é autor de uma das mais extensivas biografias já publicadas sobre Che Guevara.

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